sexta-feira, 22 de março de 2024

A feira de domingo

Eu era bem pequeno quando já sabia que domingo chegava pastel da feira em casa. A família toda comia e cada um tinha o seu sabor. A primeira casa que lembro de morar era perto da rua da feira. Conforme os anos passaram eu fui mudando de casa de novo e de novo, por vezes para mais longe e por outras de volta para perto da feira. E mesmo quando já nem morava mais em Osasco, se voltava para a cidade aos domingos eu passava na feira para comprar pastel. Nesses tempos eu já ia com o meu filho, um bebê de um ano dando seus primeiros passos e mordiscando o pastel como conseguia (nem comia um todo). Lembro também de ir à feira para comprar todas as frutas e verduras que ele comeria na semana, e me sentir como a minha mãe que havia feito o mesmo por mim.


Minha mãe ia (e ainda vai) na hora da xepa e voltava para casa com mais frutas e legumes na sacola do que cansaço no seu corpo, por mais contraditório que isso soe. Boa parte da comida da semana nascia dessa ida à feira. O suco de maracujá que acompanhava as nossas refeições. A cenoura para o bolo que a minha irmã fazia. A banana no prato com arroz e feijão quando faltava dinheiro para a carne. Ainda hoje se a minha mãe não vai à feira algum domingo, sente falta.

Antes de ir com o meu filho, eu uma criança ia às vezes junto com a minha mãe. Ela me comprava brinquedo todo domingo e quando não podia, eu chorava, mimado que era. E no quando que morei por mais tempo e o mais perto da feira eu ia sempre comprar pastel com o cachorro da família, Cacau, que de tão magro passava pelo vão das grades do portão para ir e vir como bem quisesse. Eu era já um adolescente, acordava domingo cedo e o Cacau já me esperava porque até os cachorros do bairro sabem quando é dia de feira na Analice. Paciente e do meu lado na barraca de pastel me deixava comer sem pedir por nada, mas aceitando os pedaços que eu dava. Voltávamos para casa juntos, não sem antes passar na banca de jornal, hoje fechada, para comprar alguma coisa para ler no dia.

Hoje eu vou para a feira com meu cachorro (outro), o Cosmo. Passo em uma barraca de pastel para o meu e em outra para a porção de mini pastéis que meu filho, já um menino de doze anos, gosta. Eu vou cedo então ele me espera dormindo em casa, e quando eu chego ele já sabe que eu chego com pastel da feira, porque é domingo. E acorda me perguntando se lembrei de comprar caldo de cana também.

Um comentário:

  1. Meu irmão Henrique, carinhosamente conhecido por nós da familia e amigos da feira como Cidão.
    O trocadilho não faz sentido nenhum e nunca fará, porém para nós da família, não há metáfora que consiga explicar o trocadilho ou, não há trocadilho que consiga explicar a metáfora.

    O nosso pastel de domingo transcende gerações, faz parte de nossas vidas.

    Manchinha
    Seu irmão

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